sexta-feira, 28 de julho de 2017

Um estudo melancólico de objetivo incerto

 "O amanhã, o amanhã, o amanhã avança em pequenos passos, de dia para dia, até a última sílaba da recordação e todos os nossos ontens iluminaram para os loucos o caminho da poeira da morte."

    Não há brisa marinha. Não há cantiga de pássarinhos. Não há sorridentes raios de Sol. Nem ao menos há o frio e triste ar sueco. Não há nada. Há apenas um quarto escuro, com uma cama de vermelho lençol arrumado. E de tudo que não há, o mais incerto é minha presença.
      Amaras invisíveis prendem minhas mãos. Meu corpo atado ao nada, minha mente... livre de tudo. Minto. As paredes ao meu redor são tênues vêus, deixam tudo entar, mas apenas o nada a de ficar.


Quero ir
preciso ir
me deixe ir
por favor,
tenho medo
muito medo



         Meu corpo não queima em ácido como em filmes B, muito menos sofro de crises como a de Pixote, o que sofro?

         Será talvez minha angústia a de Feline em sua Doce Vida? O luxo do luxo. Atarme hei a luzes sem brilho. Imito insetos e vôo por entre joias reluzentes, pouso em carnes atraentes e as beijo com minha língua fétida, habito casas estranhas no topo de montanhas, projetos arquitetônicos que nada servem além de orgulho. Falho. Nem ao mesmo asas tenho. Joias de luz morta. Trago-lhe flores mortas em um ato de poesia. Amor ou desespero de ser visto?

       Será meu pesar próximo ao de Terence Malick?  A vida sequênciada. Imagens e imagens, cada uma lutando para se manter viva de forma única. O excesso poético. "Sou eu quem mais brilho" dizem todas. Meros devaneios mortais, com o único pé temporal o necessário final. Mas não se apresse, pouco importa a beleza, pouco importa a emoção, ou a completa falta dela, tudo há de se acabar.

            Será minha dor a frustação de Kurosawa?  Frusto por não saber como viver, chego até a temer, ter raiva. Devo lutar sabendo que devo falhar? Defendo a quem? Eles? Mas quem são eles? Ingratos, todos? Veja como sorriem para mim, desconfio de quem seria o cuspe em minhas costa. Minha espada, corta sua carne. Sua máscara, corta minha alma. Para a vitória deles devo ajoelhar na lama de sangue. Honra é como chamam. A cántigos eufóricos de um recém liberto povo, choro ante o túmulo sangrento de meus irmãos.
...
"Apaga-te, apaga-te, fugaz tocha! A vida nada mais é do que uma sombra que passa, um pobre histrião que se pavoneia e se agita uma hora em cena e, depois, nada mais se ouve dele"
...

           Por que tanta dor? Por que ao redor de eras nossa única ligação é o pesar? Lembro-me de um ditado Tao "A dor é a única constante universal", não me lembro do autor, acho que nunca soube quem forá.

     Quantas dores existe no ser?

A dor da solidão contrastada de "Lost in Translation"
A dor do moinho de sonho que é a vida em "Abismo de um sonho"
A dor confusa de "Sétimo Selo"
A dor opressiva de "Deus e o Diabo na terra do Sol"
A dor romântica de "Girassois da rússia"
A dor bruta de "Amarelo Manga"
A dor oculta de "A liberdade é azul"

E muitas outras dores que rondam nossa amada.

  Qual seria a melancólia relação do cinema com a triseza? Por que todo o espírito artístico é cercado de mágoa? A boa arte é boa por culpa dos espinhos, ou a boa arte seria boa por sí só?

  Mesmo o mais besterol dos filmes possui lentes azuis. Lembro-me de uma vaga fala em "Os normais". O flerte do ridículo real com a espetacular condução cinematográfica decide tomar um tempo para tragar um cigarro em certo episódio, e entre fumaças godarianas conta-se um pequeno segredo: "Todos já pensaram em se matar. Hoje de manhã mesmo eu pensei 3 vezes. Sabe aquela loirona, alta como um prédio e de olhos azuis como o vazio céu? Então, me contou que pensa em se matar todos os dias"

Piada inocente, ou segredo cruel?


        É certo que a exibição pura e vulgar de uma emoção nada emcontra em nossos corações. Filmar horas e horas um casal apaixonado só trará tédio. Erro tão comum em nestes tempos estranos. Lembro-me do estranho banho que tomei ao fim de "Loucamente Apaixonados" Talvez a presença da dor sirva justamente  para engrandecer um amor. Se todos fossem felizes, ser feliz seria o habitual, tornando-se dessa forma normal, só mais um estado de espírito que sentimos todos os dias. Talvez, se todos fossem felizes, teriamos que definir novos, provavelmente mais agressivos, padrões de felicidade. Na suécia tornou-se comum jogos agressivos, situações controladas que nos colocam em perigo mortal, o falso risco de vida, a injeção da adrenalina, mantenha-se constantemente drogado para nunca mais sentir o vazio da vida. Mantenha-se constantemente drogado para nunca mais precisar viver....
 Nem eu ao certo sei por que digo isso, é tudo muito.... muito tudo.

  Cego de amor
   Cego de dor
    Cego de pavor
     Cego por opção

       Muitos críticos crêeem que a câmera deve simular o olho humano. O telespectador, por mais que passivo, vive tudo aquilo como se estivesse lá. Os cortes, nem um pouco reais mas esqueça isso dizem eles, servem para te guiar pela ralidade projetada. Vão te levar ao êxtase emocional. Mostrar a dor talvez seja uma forma de ganhar simpatia. Olhe, nosso mundo não é diferente do de vocês, nós também choramos, nós também gritamos, nós também sofremos, venha, sinta meu mundo, viva minha vida, juntos, juntos, juntos, juntos.

         Cada dia mais estamos mais separados. Mesmo a uma mensagem de distância nós nos sentimos mais e mais sozinhos no mundo. Curioso, não? Na era da conecção, poucos são aqueles que realmente se conctam. Liquidez inerte. Talvez seja isso que o cinema tente fazer, unir as pessoas. Juntar estranhos em uma sala escura, um ambiente de natureza hostil, e faze-los dividir emoções. Viver de forma real através do irreal.        Não. Não nós unimos após a sessão de cinema. Assim que acaba o filme, assim que acaba a vida, levantamos e vamos embora. Poucos pensam sobre o que acabaram de ver, e estes loucos por muitas vezes pensam sozinhos.

        Talvez o cinema não deva unir o eu com a sociedade, talvez sirva para unir o eu com a irrealidade. Se a vida é sofrida, se o fetiche da TV não o mais satisfaz, se nada faz sentido, vá ao cinema. Brincaram comigo uma vez, seu sonho é criar mundos para fugir da tão real falsa vida. Viram o trailer do novo filme do Selton Melo? "Cinema é uma coisa estranha. Você fica duas horas num local escuro cuidando da vida dos outros ao invês de cuidar da sua". Mostrar a dor no cinema talvez sirva para nos alertar, prepara o terreno para a vindora felicidade. Olhe! Veja como ela teve que lutar antes de poder sorrir em paz (Ideologia). Veja como o amor deles é romântico e eterno (ilusório). Veja como apesar de tudo aquilo eles ainda conseguem se abraçar (mentira cruel que rasga os maltratados terrenos de meu cerne).
       Hoje um homem me disse "Fui num teatro. Assisti 'Os Miseráveis'. Detestei. Aquela tristeza toda não me alegra, não é meu tipo de espetáculo, quero mais é ver 'Cantando na chuva'!". Não entendo, nunca entendo. Cinema deve servir para me confortar? Talvez seja este o secreto prazer em ver filmes "tristes", relembrar que a vida é uma merda. Olhe, a vida é um saco, culpar seus pais por te trazem a esse mar de dor é uma boa, egoísta. Mas já que está aqui, e até agora todas as balas de seu revolver atingiram apenas seu nariz, veja esse filme. Lembre como a vida de todas é uma merda, todos sofrem. Sabe o que realmente doí? A felicidade. Se não houvesse os tênues momentos de felicidade (felicidade não prazer, seus modernos líquidos) não haveria parâmetro ditador de tristeza. Ora bolas! Se tudo é azul, não existe vermelho e muito menos verde! Saber que todos sofrem é reconfortante para aquele que sofre, é como um saber de um velho sábio, "a dor é a única constante universal". Por que todos sorriem enquanto eu choro? Como faço para sorrir? Deus? Dinheiro? Prazeres vazios? Não. É a persona deles que sorri, nunca eles. Olhe, saber que a vida é boa é o maior choque para o melancólico, pois isso significa que ele é o real culpado de sua própria desgraça.
Perdoe-me Rosa, mas acho que devo, se me permite, fazer um adendo a seu pensamento: Aquele que tenta se mover verá as correntes que o prende. Correntes cunhadas pelo meu próprio punho.
 É confortável estar preso sem saber. Mentira. É a dor de "A vida de uma mulher", angústia sartriana, sofro sem nem ao menos saber o por que.

...
 "É uma história contada por um idiota, cheio de furia e tumulto, nada significando"
                                                   -Macbeth

      Estas citações, não são elas que me atormentam, o que me atormenta? Espero ter errado logo acima, o cinema não deve ter sentido definido, a arte é bela como a liberdade, tente defina-la e irá quebrar sua própria essência. No fim não chegamos a lugar nenhum, após tantas palavras, tantas dúvidas, tantas dores, nada de concreto encontramos. Nem ao menos sei se devo pedir perdão a você leitor, não sei se errei, estou tão confuso quanto você. Meu quarto continua frio e escuro, talvez tenha feito tudo isso apenas para te-lo comigo por alguns minutos. Mas agora você deve ir, não perca mais tempo comigo. Viva! Condene-se a ser livre. Corra pelas curvas da vida como nuvens, indo e vindo sem nunca pesar, sabendo que teu único objetivo é definhar em lágrimas e se acabar. Orro que pelo menos acabe sobre um casal de namorados, que deita na grama e divide sonhos, olhos virgens de almas leves e românticas. "Duvido que alguém realmente seja feliz. Eu sou feliz. Você deve ter menos do que vinte anos".
   Nem todo filme mostra uma dor como a da "Cidade de Deus", na qual tudo não passa de um problema social. Como nem todo filme mostra uma dor como a de "Annie Hall", na qual tudo não passa de um problema pessoal. Talvez seja isso que queiram nos dizer, todos sofrem, independe do externo, o interno sempre vai doer.



     Posso lhe contar uma última nota? Depois dessa deixo-o voar. Vou lhe revelar minha maior angústia. Sentenças que tiram me a alma. Cortam me o sonho:

       Machado de Assis, negro, brasileiro, eplético, escritor de uns dos livros mais tristes que conheço, disse nosleito de morte "A vida é boa"
       
        Machado de Assis, humano, disse no leito de morte "A vida é boa"

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